Título alternativo:
último dia em Dublin
Sei nem por onde começar
essa história. Vamos por partes.
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Cêis ficô sabendo
daquela história em que os boys in blue (morri com esse slogando time de whatevs de Dublin) encontraram Daniel Harry Pottah Radcliffe em Grafton Street enquanto
comemoravam alguma coisa, convidaram ele pra ir pra casa festejar junto e ele
foi?
Pois é. Eu, andando
pelas madrugs em Dublin pela Phibsborough Road não tive a mesma sorte.
Mas estou me adiantando.
*****
O primeiro passeio do
dia foi ao Glasnevin Cemetery. Turismo no cemitério, quem nunca? Mas vale muito
a pena porque meldels do céu, o que vem a ser a vegetação do local? E as
lápides, os túmulos, as flores e tudo. Se eu morasse em Dublin, tenho certeza
que levaria meu notebook pra debaixo de uma daquelas árvores e passaria mil
horas esquecida ali. O lugar tem meu som favorito, que vem a ser o do vento
batendo nas folhinhas. E, ao contrário de um parque comum, não tem gentes
acumuladas ou protagonizando ~senas~ de demonstrações públicas de afeto.
Foi muito maravilhoso
descobrir que o cemitério era muito perto de onde eu estava hospedada, porque a
essa altura meus pés já não obedeciam mais ao comando de andar e eu estava
revoltada por ter que diminuir os passeios por detalhes técnicos.
Ultrapassamos o portão e
com a gente o rabecão [haikai] que estava levando um vovô pro enterro. Em
seguida, veio uma limusine com pessoas muito alegres e sorridentes pra quem
deveria ser um parente próximo.
raloín
Passamos pela galera do
enterro e continuamos nosso caminho pelas lápides. Tinha um aviso muito
simpático de que era compreensível a vontade de fotografar tudo, mas pra gente
fazer a fineza de não expor as pessoas e eu só entendi muitas lápides depois,
quando dava vontade de fotografar fotos e poemas e milhões de globinhos de água
que as pessoas deixam lá. Não sei quantas horas levamos andando pelo cemitério,
mas eu ficaria o triplo. Fácil.
Tirei fotas Doctah Who
inspired e ganhei like e retweet de quem quer que seja que cuide das xoxomídia
do cemitério, achei muito maneiro, me deixa.
don't blink
*****
Pra dar ordem a esse
dia: começou com o passeio no cemitério, onde pude recuperar parte das minhas
habilidades motoras. Continuou com a ida ao jardim botânico, que levou horas e
também não estraçalhou completamente a condição física dos meus pezinhos e aí
eu lembrei que existia um plano de ir ao pub à noite.
O dilema: se fôssemos
pra casa, eu teria forças pra sair à noite, mas não teria roupas. Se eu fosse
adquirir roupas, teria roupas (é mêmo?), mas não teria forças. E AGORA?
Obviamente, fui comprar
roupas.
Pra ser bem sincera,
mais que roupas, eu precisava de um sapato apropriado. MÁ É NUNCA que eu iria
ao pub de tênis, minha gente.
A ida ao centro da
cidade (aquilo era o centro? Jamais saberei) pra adquirir vestimentas e sapatos
acabou com o restinho das minhas energias, de modos que depois que tomei banho
e me “““““arrumei”””” (a incrível arte de jamais superar a mala perdida e o
figurino que estava na sua mente desde o Brasil praquela ocasião), tive que
tirar força de vontade das orelhas pra não cair no choro pela, sei lá,
23904857341ª vez. Tava ali uma feia arrumadinha, mas tava pronta.
Aí aconteceu um bolo de
cenoura com cobertura de brigadeiro (num descrevi nem metade das experiências
da maravilhosa cozinha da ofélia do
Freddy, que teve até mesmo uma torta homenageando dona Cecília restauradora)
muito maravilhoso com M&Ms desejando que eu ficasse e pronto, eu fiquei
feliz de novo.
Importante. Harry
Potter. Cemitério. Bolo de cenoura. Pub. Última noite em Dublin. Só pra vocês irem acompanhando até aí.
*****
Fomos correndo pro pub
porque obviamente saímos em cima da hora, mas tudo deu certo. Sentamos bem
felizes e contentes e eu pedi uma bebida contendo alcoóis verdadeiros pela
primeira vez na vida, só porque era divertida a vibe de ir com a notinha de
dinheiros europeus até o balcão. Muito cena de filme risos kkk. E eu pedi um
mojito porque fui enganada. Me deram mojito de tequila e eu achei bom e quase
morri com o ***verdadeiro*** de qualquer que seja o veneno que eles colocam lá
dentro. Nunca terminei o copo muahahahaha.
Aí era vódega, cerveja,
salchichão e eu entrando em pânico porque não consigo pertencer ao ambiente
noturno em nenhum continente (não que eu já tenha ido em todos, mas né?) e,
quando eu menos espero, o pub entra numas de balada. Com pista, DJ, luzinhas
piscantes, musga alta e o escambau. HAHAHAHAHA.
fota de balada na europa pótchy!
Apenas os mais fortes
sobreviveram a essa mudança de vibe e fomos lá pra pista, mostrar o que que as
baiana do sul têm.
[parêntese]
Eu tenho um problema
sério com ambientes de música alta que privam os amiguinhos de diálogos. Na
impossibilidade de falar com os outros, eu começo a falar com as vozes da minha
cabeça e aí não dá certo.
Porque eu tenho
impressão que na balada rola toda uma obrigatoriedade de ser feliz. As pessoas
estão cantando com copinhos levantados no ar, dançando, rindo, dando em cima de
gente que jamais lhes daria bola nem hoje, nem amanhã, nem no dia do juízo
final e eu tenho impressão de que não poderia estar mais desconectada do lugar,
pensando em como seria sensacional estar na sala de alguma casa quentinha, de
pantufa, com 14 amigos, rindo e tomando suco de abacaxi.
Nessa balada
especificamente, eu ainda estava no fim do inferno astral (que só quer dizer
tensão pré-aniversário, no meu universo), sem minha mala e a caminho de outro
lugar estranho. Por mais sensacional que parecesse antes de eu viajar, parecia
meio apavorante ali naquele momento.
[/parêntese]
Aí eu estava lá
alternando pensamentos entre “UHUUUU TÔ NA EUROPA” e “pqp, quiqui eu tô fazendo
aqui?”, quando começou a tocar Florence and the Machine. Na. Balada. E eu
pensei que não há meio de ficar baixo astral num lugar que toca Florence na
naitch. E depois tocou Mumford and Sons. Mas não foi que ~apenas~ tocou. Foi
que o povo todo parou de pular e começou a berrar do fundo dos pulmões “I really
fucked it up this time, didn’t I, my dear?” e de olhinhos fechados e eu nunca
me senti tão pertencente a uma população como naquele momento. Depois começou a
tocar Mr. Brightside e foi aí que eu mandei a filosofação toda pro espaço e fui
pular como se não houvesse amanhã e danos permanentes ao meu pé. Nesse ponto
tava muito me identificando com a trilha sonora da pior DJ de todos os tempos. Foi só terminar com toniiiIIIiIiIiiigh weee aaaare yooooung and I set
the world on fire and went brigher than the Sun.
Aí todos lembra que
alguém do grupo tem que trabalhar amanhã cedo e já são, veja só, 3 horas da
madrugs, vamo pra casa? Vamo.
Eu juro que a sensação
térmica era de menos douze graus, porque tava um frio do inferno aquela rua.
Ventania, garoa e a minha pessoa SEM ROUPAS DISPONÍVEIS trajando somente um
cardigan, porque era o que tinha. Provavelmente nunca passarei tanto frio de
novo na minha vida quanto naquele momento. E nas oropa todos anda a pé, então
seriam uns 20 minutos daquela delissia até chegar em casa. SE eu
tivesse sorte.
Porque no meio do
caminho tinha um irlandês, tinha um irlandês no meio do caminho.
Shannon (que na verdade
se chama Seanan e pronunciavam XANA mesmo) ouviu brados da amiguinha que dizia
que o melhor lugar do mundo era o Brasil e não era sei lá onde nos cafundós da
Irlanda e achou muito maneiro simplesmente concordar também aos berros, no meio
da rua, na frente do lugar onde ficam os bombeiros.
Todo mundo parou pra
discutir a relevante questã da humanidade ali no meio da rua, na madrugs, no
climinha gostoso e aconchegante e eu só me perguntava WHYYYY, LAWD, WHYYY.
Shannon tinha 4 metros e 10 de altura e tava me incomodando
olhar pro alto e ele tinha um sotaque alemão que Q//// e eu entrei na
discussão, pra ver se esquentava o ar à minha volta.
Shannon estava perdido
porque era de Droheda (?) [até entender essa palavra naquele sotaque foi meia
hora] e nós estávamos em Phibsborogh ou algo assim e nem pense em me perguntar
o que isso significa geograficamente porque eu não faço ideia, mas o caso é que
Shannon não sabia onde estamos, pra onde vamos, de onde viemos porque morava
fora da Irlanda há duzentos anos e atualmente mora na Alemanha. AHÁ, entendi de
onde veio o sotaque.
Aí ele brigou comigo
porque não tinha sotaque coisa nenhuma, eu que tinha. CEJURA.
Recomecei a andar porque
tava com frio, fomos os quatro berrando pela rua, até que eu me dei conta que
indo cada vez mais pra dentro do bairro, a pessoa que estava perdida não ia
mesmo se encontrar, né? Ô shana, cê vai seguindo a gente? Depois comé que cê
volta? Aí alguém responde:
- ELE DORME NO NOSSO
SOFÁ.
HAHAAHAHAHAHHAHAHAHHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAH
Setenta e oito tipos de
pavor tomaram conta da minha mente. Sério mesmo? Um completo estranho vestido
de preto, com 6 metros e meio de altura, nascido na Irlanda,
morado na Alemanha, catado na rua, dorme no sofá? Aparentemente, na Europa
pótchy.
Em menos de 10 minutos
eu era a pessoa que mais infernizava shana pelas ruas frias de Dublin.
Encontrar o Harry Potter não podia, né? Hum.
*****
xenon curtindo um brigadeiro só que não
Chegamos em casa,
Shannon entra como se fosse da família. Vamos pra cozinha, Shannon senta como
se fosse da família. Abrimos o bolo de cenoura, Shannon come como se fosse da
família.
- quiqui vem a ser esse
troço marrom em cima do bolo? Nojento...
(Vale lembrar que essa
conversa toda acontecia em uns 8 sotaques de inglês, um mais ininteligível que
o outro.)
-meu, xinga a mãe mas
não insulta brigadeiro?
E até explicar o que
vinha a ser brigadeiro, a amiga número um foi embora dormir. Sobramos eu,
Freddy e Xana na cozinha, enquanto eu tentava achar uma solução pra noite do
apocalipse.
Freddy tava achando tudo
muito tranks e Shana começou a reclamar de sono. Tacamos ele no sofá, fechamos
a sala e fomos dormir. “““““Fomos”””””. Freddy capotou-se e eu me tranquei-me a
mim mesma no banheiro com a minha nécessaire, meu passaporte, meus dinheiros de
européia rhyca e fiquei lá orando pra Jesus pra que Shannon não me encontrasse
tão próxima de uma banheira e não roubasse meu único rim.
Quando o dia foi
amanhecendo, tive vergonha dos outros moradores da casa me encontrarem nessa
situação deprimente e voltei pro quarto. Quando começaram a acordar e sair pro
trabalho, cabei pegando num soninho que deve ter durado umas duas horas e
acabou num daqueles despertares de filme, sabe? OMG TÔ VIVA? TENHO UM RIM
AINDA? JÁ É AMANHÃ?
Me lembrei de que não
tinha recipiente pra colocar tudas ropa que eu adquiri e resolvi tomar banho,
café da manhã e ir comprar uma linda maleta no brechó. Aí a realidade me deu um
soco e eu lembrei que shanoon deveria estar no sofá ainda. Tava. Dormindo como
um anjinho.
Fiquei com inveja da
coragi.
Sentei na cozinha e
comecei lentamente a comer tudo que existia, de bolo de cenoura à bolacha
digestive (nunca comam, esse barato vicia mais que crocs), quando vejo
xana apontando no corredor, descalço, sissintindo em casa.
- bom dia, preciso ir
embora já?
RISOS
- não, sentaí.
- meodeos, quem come
bolo e bolacha no café da manhã? Éca.
- quiqui cê come?
- torrada com feijão.
AÍ SIM, HEIN?
- tem não, quer café?
E ele levantou e fez
café pra si mesmo como se estivesse em casa.
10 minutos depois de
completo silêncio na cozinha, shannon me agradece pela hospitalidade.
- mas, bem, eu nem moro
aqui!
- mas era você que tava
mais apavorada comigo aqui e você não me mandou embora, brigado.
Aí eu tentei entender
que cacetes o infeliz tava fazendo perdido na cidade natal. Nem eu, gente. Nem
eu.
- então, é que ontem foi
o enterro do meu avô no Glasnevin Cemetery e eu passei a tarde na casa da minha
tia, que é aqui em
Phibsborough. Aí é costume ir ao pub pra beber quando alguém
morre, mas tava todo mundo feliz demais e eu fiquei #muito #chatiado. Quando
reclamei, meu pai me acusou de ser nazista como meu avô e eu pulei o muro do
pub e fugi.
QUEM. NUNCA.
Calmo todo mundo, que lá
a pessoa paga antes de beber, de modos que Xana não deu calote na conta.
Mas aí eu pensei.
Enterro ontem de manhã no glasnevin? Eu tava láááááá! Eu viiiii! Compartilhei
essa informação com o amiguinho e ele ficou todo sentimental, achei que ia
chorar e eu não ia saber como proceder, mas aí criamos um vínculo de amor e
amizade que durou pra sempre, Shannon já me convidou pra ir dormir no sofá dele
na Europa, como forma de gratidão.
Enquanto Freddy não
acordava, filosofamos sobre a vida, o universo, Dom Casmurro (juro) e tudo
mais, e ele queria comprar minha mala, me levar no aeroporto e me abraçar (acho
que era muito amor mesmo, porque ninguém se encosta na Irlanda).
Só sei que quando
desovamos Seanan naquela esquina, a única coisa que eu pensava era: KKKKKK
MINHA MÃE VAI ME MATAR QUANDO SOUBER.
*****
Comprei a mala e tantas
peças de roupa que não cabiam mais na mala. Apertei o que podia, vesti o que
não cabia e fui pro aeroporto de táxi porque eu sou rica que nem a Angélica. E
o motorista era o mais fofinho dos motoristas fofinhos de toda a galáxia e eu
queria que ele fosse meu terceiro avô, porque olha. E a gente foi conversando o
caminho todo, porque eu entrei em modo mongol porque o carro era do avesso e
ele disse que eu devia ser muito inteligente e eu quase transferi todo meu
dinheiro pra conta dele, porque pra ganhar meu amor pode chamar até de gorda se
chamar de inteligente.
Querido motorista de
táx, te amo.
*****
Uma fila de bolsa
família e 14 choques depois (nem perguntem), eu estava entrando na sala de
embarque rumo a Londres.
*****
Sempre achei engraçado
em aeroportos no braziu os estrangeiros pendurados no celular cas suas
respectivas famílias, falando por mais de meia hora. QUE RICOS! Mas meu chip
indiano me proporcionou essa experiência. Considerando que aquilo era
considerado voo doméstico e praticamã não tinha não europeus à minha volta, eu
era a estrangeira pendurada no telefone. Uma hora e meia chorando de perder o
ar com a minha pobre irmã, que ouvia muito amorosamente meu chilique.
Não me pergunte porque
eu não sei a razão de ter chorado por uma hora e meia.
Aí eu finalmente entrei
no avião e o resto fica pra próxima, porque nem um voo de uma hora daqui até ali é uma coisa
fácil quando você é eu.
Beijos e não parem de
seguir no reader.