quarta-feira, 16 de março de 2016

chain and ball



O funcionalismo público é um ecossistema bastante interessante de se observar (não).

Eu já disse e repito: é uma desgraça tanto pra quem usa como pra quem faz parte, só que é bem pior pra quem tá dentro, eu posso lhos garantir. Desde 1999 nesta vida, eu sei do que eu tô falando.

Uma coisa que acontece nesse ambiente é a competição pra mártir. Porque, amigos, se tem 23 pessoas não trabalhando, tem 2 trouxas carregando o silviço desse povo todo (por isso que às vezes as coisas andam devagar). Aí os dois trouxas - me incluo entre eles - não conseguem passar uma semana inteira sem o vangloriamento próprio, tipo eu que carrego esse país. Cê ameaça todo mundo dizendo que se um dia pegar uma catapora, as coisa param TUDO e aí quero ver cêis me dar valor!11 E o pior é que é verdade, mas quem que guenta? E o recalquinho dos trôxa é saber que tem gente que passa o dia no ambiente de trabalho fazendo vários nada, isso quando se dá ao luxo de aparecer.

A outra coisa bonita que acontece é meique derivada da primeira: fiscalização de vida alheia. Eu já parei com isso faz tempo, porque desde que a pessoa não dificulte minha vida diretamente, ela que se lasque. Mas é assim: os trôxa fiscalizando os outro trôxa pra ver quem trabalha mais e sofre mais, os trôxa fiscalizando os vagabundo pra poder dizer que trabalha mais que aquele ali ó, os vagabundo fiscalizando vagabundo pra ver quem é que faz menos, porque ali naquele extremo a competição é ver quem faz menos pra ganhar a mesma coisa.

E é por isso que acontecem momentos bonitos tipo esse de agora, a implantação do ponto eletrônico.

Pra quem trabalha direitinho é uma bosta? É uma GRANDE bosta. Mas alguém acredita que é o jeito de fazer os vagabundos trabalharem (não é), então todo mundo se lasca.

- mas, vaneça, se você trabalha direitinho, qual é o problema com o ponto?

O problema é essa bola acorrentada no meu pé. Tem dias que eu fico na minha cadeirinha pra sempre? Tem. Mas tem dias que tem que ir em outro campus, outra sala, tem dia que você tá saindo pra almoçar e uma aluna faz o favorzinho de desmaiar e você tem que ficar esperando a ambulância buscar e dar soro, tem dia que você tem que levar estrangeiros pro aeroporto, tem dias que você até já foi pro conforto do seu lar e te ligam às 8 da noite pra voltar correndo porque tem criança fazendo idiotice dentro do campus e você larga seu sanduíche de pepino e suco de goiaba pela metade pra ir acudir. 

E aí cê sai pra almoçar correndo como uma louca desvairada, come de qualquer jeito, corre pra voltar, chega 3 minutos antes da hora de bater o ponto, mas a bosta do ponto não bate com um mínimo de 60 minutos. Aí cê volta a trabalhar, se distrai e, quando lembra, se dá conta que serão 40 minutos pra compensar NO SISTEMA, que fisicamente cê tava aí.

Num tem como não amar.

Eu não me opunha a realizar ~trabalhos diversos~ até mês passado, acho que a gente tava aí pra isso mesmo. Mas com o advento do ponto, eu não saio mais daqui. Num é pra botar a bola de ferro no meu pezinho? Então eu fico aqui. Inclusive tenho que estudar, tá ótimo (não é como se eu estivesse concentrada e estudando, mas ok). 

Só que agora, ainda mais no começo, as pessoas vão ficar naturalmente pregadinhas em suas cadeiras, pra provar que elas estão lá sim, não é o amiguinho que tá batendo o ponto por ela. Isso também faz com que muitos trouxas não tenham mais que ficar se deslocando pra cobrir buraco, então tamos operando com estacionamento cheio, portas abertas, luzes acesas (até todo mundo descobrir comofas burlar o sistema)

Minha sala é tipo uma central. Do que, você pergunta. De tudo, eu respondo. Até gente perdida procurando o presídio vem parar aqui. O que facilita muito pros fiscal de vida alheia, porque é só vir aqui pra saber das 9dade. Mesmo antes, meu fiofó tá pregado aqui, porque é pra isso que eu sirvo, pra dizer que a pessoa está na sala errada, ligou pra sala errada, tá fazendo errado. Então eu tenho que ficar majoritariamente aqui.

Tem um infeliz que vem 83 vezes no dia, pelas mais diversas razões, fala OIIII em todas elas (desnecessauro), às vezes puxa conversa, às vezes fala bobagem. Eu vou contornando a situação como dá, porque é isso o dia inteiro, tô acostumada.

Aí da última vez, ele veio me dizer que está enjoado de me ver sentada no mesmo lugar. Kirido, cê trabalha na burocracia, tem armário que tá no mesmo lugar há 60 anos, talvez você tenha escolhido o lugar errado pra trabalhar? Então ele completou com "você tem que sair daí, trocar de lugar na sala, fazer exercícios físicos".

AH, NÃO.

NÃO.

PÉRA UM POUQUINHO.

As 9 horas que eu passo aqui, eu tenho um TRABALHO a cumprir. Um trabalho que envolve uma mesa e uma cadeira. Eu passo esse tempo todo sobre minha bunda? Não. Mas não dá pra fugir muito disso, meu amô. Cê quer que eu vá aonde? Cê sugere exatamente o quê? 

Agooooooooora, se você estiver INSINUANDO que eu devo me exercitar no meu tempo livre, que vem a ser 100% fora da sua jurisdição, aí eu acho que a gente vai ter que conversar mais sério porque:

a) isso realmente não é da sua conta e
b) quem foi que disse que eu não faço exercícios?

"Ah, mas é por causa da saúde que eu tô falando, faz mal a pessoa passar o dia sentada."

Tio, vai trabalhar nos correios, então. Lá o povo anda o dia inteiro, parece.

Olha, fica difícil agradar as pessoas. Lutam bravamente pra enfiar a gente num esquema que obriga a sentar a bunda na cadeira, mesmo que seja pra aprimorar a habilidade de matar mosca com raquete (ou colocar caminhos das índias em dia, por que não?), mas também não pode ficar sedentário, que aí já é ruim demais pra saúde.

Mais um dia feliz trabalhando pro governo :)