segunda-feira, 8 de agosto de 2011

para quê? Paraguaio.


ou: a incrível história de como eu fiquei (ainda mais) surda

Todos sabe que eu não escuto direito, né? Que meu ouvido direito morreu num episódio causado por “““““amigos””””” maconheiros modernos, livres, desapegados do sistema, que achavam que eu era reprimida e tentaram me matar apresentar novas formas de curtir a natureza. O que ninguém levou em consideração foi que eu tenho ALERGIA à natureza como um todo em si e que maconha alguns tipos de mato podem me matar.

Daquela vez chegou perto, mas acabou que eu sou vaso ruim e só matou minha audição mesmo.

A gente se acostuma com a limitação auditiva. Porque assim, não é uma ciência exata. Tem horas em que alguém pergunta “nossa, que será que foi esse barulho?” e eu não ouvi NADA, tem horas que o tic tac do relógio no meu pulso me enlouquece. E tem ainda o caso mais incompreendido pela população: eu OUÇO o que a pessoa diz, mas não ENTENDO. Manja uma pessoa falando japonês com você? Você escuta, mas só um blábláblá, estilo professora do Charlie Brown? Então, é assim que eu escuto a vida na maior parte do tempo. Wah Wah Wah Wah.

De modos que se eu te pedir pra repetir o que você disse, por favor, repita. E repetir só a última palavra vai me deixar irritada, então façavor de repetir a frase toda, porque tudo que eu ouvi foi wah wah wah wah wah.

*****

Outro dia eu estava vendo TV na cama, com a cabeça apoiada do lado esquerdo. DeRRepente, minha irmã entra no quarto aos berros, me dando a maior bronca por causa da altura do volume. Respondo que é pra parar com o chilique, todos sabe que eu tenho que colocar um pouquinho mais alto que o normal. E ela diz “um pouquinho? Tá dando pra escutar lá da esquina!”. Levanto a cabeça pra discutir melhor e só aí me dou conta de que eu estava deitada do lado errado e o bagulho tava mesmo alto pacacete. Não posso fazer nada, já que é impossível enxergar a TV em outra posição.

*****

Então eu ia a um seminário na beirada do país. Eu adoro viajar pra beirada do país, já fui em várias delas. Acho divertido andar 10 minutos e a cara de todo mundo ser diferente, a cara do lugar ser diferente e a língua ser aquele inferno de espanhol que ninguém merece. Aí quando a fronteira é tríplice, meua mô, eu vou ficar muito contente.

O inconveniente é ter que se transportar de avião.

Não me entendam mal, eu adoro avião. Mas eu adoraria mais ainda se a pessoa fosse capaz de ler informações simples, como hora do vôo e poltrona, sabe? Até então eu nunca tinha entrado em um avião sem que tivesse que tirar alguém do meu lugar. Gente que leu o próprio cartão errado, gente que achou o meu lugar mais bonito e “vou ficar aqui mesmo, cê não se importa, né?”, gente que não conseguiu fazer check-in do lado do amiguinho e quer o meu lugar SAI DAÍ PROBLEMA SEU O LUGAR É MEU VAI FALAR COM O PAPA.

Aí eu fico apreensiva.

Troco de lugar nem por um potão de nutella.

Então tava lá na sala de embarque, vendo todos os vôos mudarem de confirmados pra atrasados e esperando a hora que ia acontecer com o meu. Não demorou. Vôo atrasado, gente besta que sabe que o embarque era até meia noite e consegue se atrasar pro vôo atrasado (gente, se sou eu, saio voano sem o babaca.), todos levanta voo, aê.

Só que ninguém conta com turbulência, né?

Veja bem, eu nem ligo pra turbulência, qual a graça de viajar sem a sensação de estrada esburacada? Meu problema é com a mudança brusca de altitude e com a conseqüente mudança de pressão.

Eu sou uma pessoa alérgica. Eu tenho medo de minha cara explodir quando a pressão muda. Mas nesse dia, a cara trabalhou bem, o que não trabalhou foi o ouvido. O esquerdo. O que """""escutava""""".

O avião subia e o ouvido entupia. Descia, entupia. Batia, entupia. Depois de alguns minutos, eu comecei a sentir a agradável sensação de mil facas ginsu fatiando meu cérebro e não conseguia mais viver, respirar, enxergar, controlar meus músculos e essas coisas. Foi lindo. Até que PLOP, adeus um tímpano.

Não sei dizer quanto tempo essa maravilha durou, só sei que quando o avião finalmente pousou, eu não sentia o lado esquerdo da minha cabeça e não ouvia NADA. Pra ajudar, lindos aeroporto sem finger, de modos que tinha que andar pela ventania de -12 graus. Era super agradável a sensação do vento batendo na cabeça amortecida, consigo nem explicar.

Nisso já era altas madrugs, pegamos o taxi da morte pra chegar no hotel (vou pular a história do taxi da morte, porque né?), confusão no hotel, outro taxi da morte, outro hotel, ar condicionado no modo inverno polar (tipo inception, inverno dentro do inverno) e eu debaixo de 4 cobertores, tentando fazer a dor passar.

Acordei na manhã seguinte com uma dorzinha perfeitamente suportável e zero de audição. E depender do meu ouvido direito não é exatamente a maior alegria do mundo. Antes do meio da tarde, na linda paisagem de um templo budista, com o vento batendo e fazendo um som muito estranho, achei que todo meu almoço ia voltar por onde veio, porque ser muito surda dá enjoo.

Agora é a hora em que eu deveria contar as maravilhas da viagem, do Paraguai, da Argentina, mas não vou. Vou só colocar algumas fotos aqui, porque ólia, a viagem em si foi muito maravilhosa demais e a vida neste momento está muito cocô demais, então né? Fique aí com a imaginação.

*****

Aí eu passei os dias todos em crise existencial, porque meu ouvido doía até o pescoço e eu tava surda e ainda tinha que voltar pra casa de avião. MÁ NEM POR UM DECRETO eu voltaria por meio de transporte terrestre daquela lonjura, ousseje, o medo tomou conta de mim.

Comprei um pacote gigante de chiclete, porque disk ajuda a aliviar a pressão, garrei na mão dedels e fui. Com um piloto muito mais rápido que o da ida, pareceu até que a gente veio voando OH WAIT KKK. Com lindos dia seco, não teve turbulência. Com poucas troca de altitude, eu só senti uma faquinha ginsu solitária me cortando o célebro. Everything went better than expected.

Mas ainda saí diretamente do aeroporto para o hospital, pra descobrir que meu pobre tímpano escangalhou-se. Pelo menos 40 dias pra voltar a escutar direito. Direito as in MAL, que é como eu sempre escutei.

Agora reflita.

*****

Peguei a receita que o médico me deu pra aliviar o horror da surdez e fui na farmácia comprar, né? Tava lá quietinha na fila, esperando minha vez, olhando o mundo todo atentamente (tô trabalhada no olho arregalado desde que diminuiu o poder dazoreia), quando minha mãe me dá a maior cotovelada.

- sua vez.

- mas a mulher não chamou o próximo!

- chamou sim, você tá surda?

OH WAIT.

Parece até a vez em que eu perguntei pro cego se ele não estava vendo. Karma is a bitch if you are.