sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Fazendo as pazes com o ocaso

E é ocaso mesmo, seu analfabeto. Eu não quis dizer *acaso*.


Sabe, eu não entendo gente que gosta do horário de verão. Eu tento, mas não entendo. Eu tenho um metabolismo meio autista, ele curte uma rotininha simpática. Aquela coisa de acordar, comer, viver e passar por toda a pirâmide de Maslow nas mesmas horas.

Se a vanessalândia já estivesse instituída, eu jamais acordaria antes das 9h ou voltaria pra cama antes das 23h. Apesar de eu ser o tipo de cerumano que funciona fisicamente melhor de manhã, meu cérebro fica benloco depois que a novela acaba (mesmo que eu não assista novela há muito tempo). Então é a hora que eu sento em frente a esta bela máquina e saio fazendo coisas inúteis, tipo escrever esta abobrinha, desenhar, editar fotos, passar os amiguinhos no zuma. Aí eu tomo o banhinho da madrugada – quando patos não aparecem pra tocar o horror – e voldor mir.

De modo que quando o horário de inferno verão começa AND termina, toda minha vida vira um caos.

Até porque o mundo é chato e eu tenho que dormir “cedo” e acordar super cedo e nego ainda se pergunta porque meu humor é difícil. Qué me ver feliz? Não me acorda antes das 9h. Um dia eu chego lá.

*****

Teve um tempo da minha vida em que eu não podia suportar a visão do entardecer. Biruta é a senhora sua mãe, cê não paga minhas conta, MILARGA (got got?).

Mas era isso. Foi num tempo em que eu trabalhava à tarde e tinha a maioria das aulas da faculdade à noite. Saía do trabalho ali por 17h e corria pra algum lugar onde janelas não fossem importantes, tipo shopping ou o andar de laboratórios da faculdade e ficava enfiada lá até estar de noite.

No inverno era fácil. Menos de uma hora depois de sair do trabalho, já estava “segura”. Agooora, no verão... a única vantagem era aproveitar o ar condicionado de qualquer um dos refúgios.

Nessa época, alguém metido a psicólogo veio me dizer que o entardecer era algum tipo de metáfora pra vida. Que o “medo” do pôr-do-sol era meique um medo de morrer e tal. CÊ JURA, digo eu. Considerando que aquela foi a época da minha vida que fica em segundo lugar em volume de visitas ao hospital (nada barra a época da morte do rim, né?), tudo faz sentido.

O caso é que eu tenho mania de passar perto de morrer. E mesmo que tenha gente que ria quando eu peço colo e digo que passei o dia achando que ia desencarnar, mesmo que tenha gente que me faça concluir que eu passo por isso muito mais vezes que um cerumano normal, não diminui o medo que eu sinto quando eu estou lá, vendo a luz, ouvindo o chamado e jurando que não vai dar nem tempo de dizer tchau e falar pra todo mundo o que eu quero e fico controlando de modo a viver de acordo com o que obriga a vida em sociedade.

Sei lá quanto tempo durou essa vibe ruim com o pôr do sol. Mas acho que acabou na época em que eu trabalhava tanto num buraco, que teria sorte de escapasse de lá viva a tempo de presenciar o evento.

Só sei que um dia passou.

*****

Mais ou menos nesta época do ano passado, tava eu lá achando que ia morrer. Pode rir, pode chamar de dramática, mas não era você que estava sentado do meu lado quando eu peguei o papel com o resultado de exame mais assustador da minha vida adulta. E, se o grande medo da minha vida até ali tinha sido precisar de um transplante de rim, a ideia de uma possível necessidade futura de transplante de coração meique deu uma derrotada na minha pessoa.

Felizmente foi só o susto.

(Resultado de exame deveria ir direto pro consultório do médico, só digo isso. Mó irresponsabilidade deixar o indivíduo hipocondríaco consultador de google enquanto gente burra que não sabe de nada ler aqueles papéis ridículos com um monte de valor de referência furado.)

Então eu tava lá, chorando litros, visualizando a vida hospitalar, o médico dizendo que meu mono-rim não ia suportar a pressão, que meu coração tava corroído, que eu tinha 3 dias de vida, mas que ia ter que passar na cama. E o sol se pondo.

Aí eu tava lá, no médico, ouvindo que um resultado ruim só é ruim mesmo se forem dois (nem pergunte) e que eu nem ia morrer, só ia sofrer mesmo por uns dias, até aquela peste desistir de habitar meu ser, que ia ter que usar colar cervical *PAUSA*

Como a pessoa sai de transplante de coração pra colar cervical é uma coisa que jamais explicarei.

*FIM DA PAUSA* por uns dias, que ia ter que passar pela seqüência benloca de benzetacil (tá escrito certo, seu ignorante, num vem corrigindo não), que ia tomar drogas suficientes pra alterar meu dna (every single january), mas que entei passou por lá e tava tudo bem agora. E o sol se pondo.

E aí eu tava lá, com o flanco esquerdo completamente destruído por um remédio maligno e com os nelvo em frangalhos pela contagem regressiva oficial pra uma nova injeção do mesmo lado. (Isso foi de manhã, o sol tava só nascendo.)

Foi aí que aconteceu uma conversa cujo interlocutor nem deve se lembrar. Uma coisa boba mesmo, meia dúzia de frases. Aquele tipo de coisa tão besta que rende letra de música tão besta quanto do ira.

(Muito irônico que seja esse o cerumano que ri da minha desgraça hoje, em dias de medo da morte.)

E o sol se pondo.

Mas o caso é que, dolorida, estragada, doente, chateada e feia – meldels, como eu tava feia aquele dia – eu passei o entardecer com um sorriso bem mongoloids nas fuça.

Tava tão alterada que produzi até uma foto decente com o meu celular.

Não importa o quanto eu quase morra, o quanto as pessoas riam e me chamem de dramática, o quanto só eu sei que dói e o quanto eu tenha vontade de matar você de vez em quando (quem foi que disse que amor não é amor se você nunca teve vontade de matar o obejeto de dejejo?), eu sempre terei aquele ocaso.

Aquela tarde vazia ridícula, que me valeu o dia. Valeu o dia. (Na mente fantasia.)