segunda-feira, 3 de outubro de 2016

pir-lim-pim-pim



Mereço uma estrelinha por resistir à tentação de fazer referência àquele texto bostíssimo não usando um título contendo as palavras "desculpe" e "transtorno". Mas é bem essa a vibe de hoje.

Hoje vamo falar de hipersensibilidade, essa desconhecida.

Sob a minha perspectiva pessoal, é claro, mas a ideia é essa mesmo, porque eu sou o centro do universo e etc.

A gente mora num país tropical supostamente abençoado por dels e etc. Não sei que tipo de pessoa se considera abençoada quando tem que viver no calor, mas não é como se Jorge Ben Jor fosse o caminho, a verdade e a vida. PQP, minha vó vai encomendar minha excomunhão. 

FOCO. 

O que eu quero dizer é que é um eterno ~passar calor~ a vida neste lugar, certo? Quem convive comigo já cansou de me ver me abanando, reclamando, debaixo do ventilador, borrifando água na minha cara, procurando a saída do arco de sonado, me jogando na piscina sem nem testar a temperatura da água previamente. Aí passa o tempo, chega maio, bate um vento e nóis tá como?

#encapotada

E não é apenas isso! É embrulhada em 4 camadas de roupa, cobertinha, aquecedor, luva e tudo mais. Aí a pessoa me vê e pergunta: cê tá com frio?

MAS É CLARO QUE NÃO. 

É justamente pra isso que eu me encho de pano, kirido.

Só que ninguém entende mais nada. Ué, cê não tava reclamando do calor? Achei que estaria só de camisetínea nesse frio e tal. ACHOU ERRADO.

Quando as pessoas tentavam usar essa lógica comigo, eu sempre respondia a mesma coisa: eu acho que tenho pele hiperativa - se tá calor eu tô derretendo, se tá frio eu tô congelando. Não tem meio termo. Não tem conforto.

E isso, mores, é ser uma pessoa hipersensível.

Hipersensibilidade é uma condição psicológica sim, mas é física e fisiológica também. É geral, é em tudo o tempo todo. É como se a gente fosse um fio desencapado E um sistema operacional sem firewall ao mesmo tempo. É um pesadelo, resumindo.

Agora pensa você nascer no meio de uma família de gente bruta.

HAHAHAHAHAHHAHAHA 

Sinceramente, que karma eu vim pagar nesta existência terrena, eu me pergunto.

Tipo, se você me olhar feio, eu vou sentir ~dor emocional~. Se você me encostar com um pouco mais de força, eu vou sentir ~dor física~. As pessoas pensam que eu tenho fibromialgia, porque eu sempre tô falando que alguma coisa dói. E eu nasci no meio de pessoas que têm úlceras e descobrem porque estão com um pouco de tosse (TRUE STORY) ou que assistem desgraças na tv enquanto conversam sobre orquídea. Eu lá segurando no semblante pra não chorar em 15 das 16 horas que eu passo acordada e as pessoas parecendo que tão 120% nem aí pra ~tudo em geral~. Não compreendo, mas aceito (que dói menos).

Quando eu digo família, neste caso, é a família expandida. Eu não conseguia engolir nenhum tipo de comprimido quando era criança - e isso também faz parte dos problema tudo - e sempre preferia tomar injeção. Mas minha pressão caía nesse momento, então eu precisava que alguém ficasse perto só pra eu não cair da cadeira. Até hoje é assim: odeio comprimido, mim dá injeçón, mas eu já me seguro sozinha na hora do desespero. Só que quando eu era criança, essa lógica não fazia sentido e todo mundo me largava sozinha na injeção, já que eu era tão corajosona. E tão aí no meu cérebro impressas diversas memórias de mim mesma sozinha em salas de laboratório, porque se eu não conseguia engolir comprimido, eu tinha mais é que me lascar.

Todo mundo me chamava pelo carinhoso apelido de pozinho, diziam que eu parecia feita de poeira e que qualquer coisa me desmanchava. Faziam piada por eu ser chorona e fracote e sensível. O.TEMPO.TODO.

Eu cresci achando que tinha mesmo alguma coisa errada comigo, que não era possível que todo mundo vivesse em tanto desconforto e conseguisse manter a calma. Demorou muito pra eu entender que pra minoria das pessoas aquilo acontecia.

Eu não consigo usar sapato de qualquer tipo sem meia, por exemplo. Desde criança. Eu usava qualquer coisa com meia. Quando me proibiram de usar meia com sandália, eu parei de usar sandália. Ahhhh, mermão... PRA QUÊ? Parece que ofendi a matriarca do clã dos Negão, porque era cada quebra pau por esse motivo que não tem explicação. E eles me obrigavam a sair de sandália e eu sentia uma dor horrível na minha pele e choraaaava. Se tivesse calor era pior ainda. Aonde quer que a gente estivesse indo, eu ia andar o mínimo possível e chorar o tempo todo, porque eu sentia minha pele queimando. Muitas vezes, chegava em casa com o pé ensanguentado e todo marcado das tiras. Tinha que ouvir que eu era feita de pozinho, que era só uma sandália, que o problema era eu.

HOJE EM DIA CÊ TEM SANDÁLIA, MEUA MÔ? Nem eu. Quero que essas merda se explodam. Ah, mas o que cê usa no verão? TÊNIS E MEIA. E na praia? TÊNIS E MEIA. E em festa? TÊNIS E MEIA. E quando não pode? TÊNIS E MEIA.

OU eu não vou OU eu uso sapato fechado, que comporte meia. Eu estarei de meia 100% do tempo da minha vida enquanto estiver calçada, mesmo quando você tiver absoluta certeza de que eu não estou usando meia. ESTOU SEMPRE DE MEIA, PORQUE AGORA NINGUÉM MAIS MANDA EM MIM :)

Pessoas hipersensíveis têm problema com textura e com o, como direi, "apoio" do sapato. Quando eu comecei a ler a respeito e tinha "pessoas com essa característica costumam ter 10 pares de sapato iguais", eu chorei. De verdade, eu chorei com a sensação de que existe uma explicação pros meus 23 pares de all star. Todo sapato que eu tenho é de baciada e toda vez que eu tento trocar de um pro outro eu preciso de uns dias de adaptação. Então são dias de all star, depois dias de adidas (porque as solas são bem diferentes), depois dias de alpargata e assim vamos. Coisa mais difícil que tem é eu intercalar marcas e modelos, porque machuca (fisicamente) e incomoda (psicologicamente). 

Tipo, faz uma semana que tô escrevendo esse post (ligêra) e em algum momento fui à manicure. Onde eu não ia fazia quase um ano. Porque é um SO-FRI-MEN-TO fazer as unhas. Dói, dá aflição, eu sinto como se fosse uma dor no dente e na alma. Eu preciso que a manicure me conheça e tenha duas horas livres. Aí tem essa perto do trabalho que de vez em quando eu tento. Lembrei pra ela todas as recomendações e, ainda assim, saí com a mão ensanguentada do salão. ENSANGUENTADA. Parecendo que houve crime. A mulher desesperada, falando que nem algodão ela trata com tanta delicadeza, mas não tem jeito: minha pele é de papel de seda, ué. 

A pessoa me encosta: marca. A roupa me encosta: marca. Eu encosto em algum lugar: MARCA. Anéis, pulseiras, colares, brincos. Tudo. Tem dias que MEU CABELO me dá alergia e marca meu maxilar e meu pescoço. Tipo hoje, que eu tô aqui parecendo que sofri uma tentativa de enforcamento porque não queria andar de cabelo preso pela rua. Fui ali rapidão tomar um banho e minhas pernas estavam QUEIMADAS da calça jeans. E não é porque tá justa ou porque eu tenho coxas de panicat. É porque é um tecido áspero que forma dobras. Cada ruguinha do jeans é um queimado diferente nas minhas pernas. Uma delícia! "Ahhh, mas por que você não usa legging?" Porque jeans pelo menos é predominantemente algodão, então o dano é mínimo. Mas aquele tecido PODRE sintético de que são feitas as leggings me destrói a pele. Naquelas 3 horinhas de academia eu até consigo, embora as costuras se tatuem no meu eu. Mas passar um dia inteiro com essa desgraça me abraçando, nem morta.

AO MESMO TEMPO, ontem eu tava conversando com o meu irmão sobre a 43ª terceira tatuagem dele e pedindo pra ele me levar ao estúdio na próxima, porque eu quero entrar no the heart project de uma forma definitiva com um coraçãozinho cor de rosa. No meu caso, é pra lembrar que isso tá aí, é pra sempre, mas eu posso parar e respirar, etc. Fui tentar falar pra ele do que se tratava, mas eu chorei por meia hora. BÃO, NÉ? E isso é bem normal, a coisa toda acontece (ou nem acontece) dentro da minha cabeça e eu começo a choraAAaAaAAAAar e nunca mais eu consigo parar. Também começo a rir, como no dia do caso da chinela voadera. É tudo sem razão e sem limite. Tipo segunda passada à noite que eu vi uma coisa que eu de fato vi, mas que não era o que eu tava pensando. E foi uma choradeira que não tinha mais fim, não consegui comer, não consegui dormir em paz, não conseguia nem tomar banho direito, porque ficar sozinha ali com os meus pensamentos estava me torturando.

Resumindo: sabe a princesa da ervilha? Aquela que procura abrigo numa casa durante a chuva e a família quer testar se é princesa mesmo, de modos que faz a única coisa que poderia fazer: empilha VINTE colchões e coloca UMA ervilha embaixo. Só uma princesa verdadeira seria capaz de se incomodar com esse calombinho (e ser grossa o suficiente pra reclamar). Pois eu sou a princesa da ervilha. 


 "a literary fairy tale about a young woman whose royal identity is established by a test of her physical sensitivity"



Eterna princesinha da ervilhinha especialzona. Quando li essa história eu ainda era criança e SEMPRE ACHEI que essa princesa era eu.



*****

Quando você encontra o estudo mais proeminente sobre HSP, que é a sigla em inglês para Highly Sensitive Person, você se depara com as seguintes questãs:


- você se sente oprimido por coisas tipo luzes brilhantes, cheiros fortes, tecidos ásperos ou sirenes?
- você fica perturbado quando tem muita coisa pra fazer em pouco tempo?
- você evita veementemente filmes e programas de tv violentos?
- você precisa se recolher em dias em que muita coisa acontece, ficar na cama ou num quarto escuro ou em algum lugar onde você tenha privacidade e possa se recuperar?
- você tem como prioridade na sua vida evitar aborrecimentos e situações pesadas?
- você nota e gosta de perfumes, gostos, sons e obras de arte delicados?
- você tem uma imaginação rica e complexa?
- quando você era criança, sua família achava que você era sensível ou tímido?


MAS MEU AMOR, GABARITAMO, NÉ?

Eu já gastei 8 mesadas em óculos escuros ou daqueles com lentes transparentes pra filtrar a luz em ambientes internos ou à noite, no trânsito. Meu maior pavor era não poder dirigir à noite, porque a luz me DERROTA. Ontem mesmo eu não saí de carro, porque estava ~em crise~ e sabia que não conseguiria andar 12 quilômetros encarando faróis e semáforos, especialmente na garoa, que faz tudo brilhar um trilhão de vezes mais. Se eu estiver sozinha em casa, não terá luzes acesas. Nenhuma. Eu ando pela casa, pelo quintal, pelos lugares todos sem luz nenhuma, eu faço tudo de luz apagada. Eu tenho ÓDIO quando as pessoas acendem a luz de manhã depois que o sol já saiu. É tão inútil que ninguém lembra de apagar. Só que meu olho é extra incomodado por luz artificial, então antes de acordar eu já percebo que as luzes TODAS da casa estão acesa. Saio do meu quarto descendo a porrada nos interruptores e amaldiçoando os infelizes que estão gastando recursos naturais inutilmente. Às vezes, um deles até mesmo está em casa ainda. O que é ótimo, porque NÃO TEM NECESSIDADE DE ACENDER 8 LÂMPADAS DIFERENTES ÀS 7 DA MANHÃ. Em assunto relacionado, odeio o sol. E, colateralmente, gente que adora o sol.

Em algumas cenas de grey's anatomy, por exemplo, eu minimizo a tela e só ouço o que está acontecendo, porque não consigo ver os closes em cirurgias. Agora você calcule se eu vejo coisas em que pessoas se machucam. Não vejo. Qué dizê, cê tá lá vendo um filme e a pessoa se corta, leva um tiro, cai a mão. Eu dou pause, respiro, penso em coisas felizes e decido se é possível continuar. Filmes com animais: NÃO VEJO. Em hipótese nenhuma. Este site é um dos meus melhores amigos no mundo. Se um filme tem um cachorro casual, eu sempre vou lá conferir se alguma coisa acontecerá com ele antes de prosseguir.

Semana passada foi uma semana ~daquelas~. Eu fiquei na universidade mais de 12 horas em todos os dias da semana, minha rotina foi drasticamente alterada, eu tive que conviver com pessoas novas, socializar, resolver problemas. O que aconteceu sábado? SHUT DOWN. Meu cérebro simplesmente apagou. Não é que eu tenha decidido, eu encostei ali 5 minutinhos e apaguei por umas 10 horas. A última coisa que eu lembro de ter feito foi responder uma mensagem (♥) depois do almoso e POF, fim. Sabia nem quem eu era na hora que eu acordei.

Eu gosto de apreciar de entretenimento cultural sozinha, porque eu choro. Orquestra, exposição, palestra. EU.CHORO. Me deixa chorar, cara. É a vida, se eu estiver consumindo arte, eu estarei chorando. Não tô triste nem nada, é só uma coisa que acontece no meu eu interior, que não me incomoda e sob a qual eu não tenho controle e eu adoraria se ninguém comentasse e me deixasse quieta. 

Uma das coisas que mais me desestabiliza é textura. Quando eu estou numa loja provando roupa, eu vou afofar a roupa toda, vou CHEIRAR a roupa, vou provar OITO VEZES, vou testar com outra por baixo. Tem alguns materiais que eu não encosto em nenhuma hipótese, tem outros que não encosto de certas formas, outros que eu começo a gritar se alguém encosta ou se ~manipula~ de certas maneiras. Da mesma forma que alguns sons me destroem, algumas palavras tiram minha sanidade mental e não tem muita coisa que eu possa fazer pra mudar as reações que essas coisas me causam (e foi esse traço específico da coisa toda que me fez acreditar que eu era autista no começo). 

Eu percebo se as vibe das pessoas mudam. Tem uma pessoa no trabalho que eu DETESTO e é bizarro: eu nem preciso entrar no prédio pra saber que o cerumaninho não foi trabalhar. Sério, é uma energia erradíssima que a pessoa emana e que simplesmente não está lá de forma perceptível. E meu humor é igualmente sensível. Se eu tô num lugar good vibes, eu fico excelente vibes. Se eu tô num lugar bad vibes, eu fico TREVAS. É bem difícil, porque tem dias que eu tô na merda e nem sei o motivo. E tem dias que eu tô na merda e sei o motivo e vejo alguém que eu gosto e o humor se recupera em 37 segundos. Toda uma sanidade mental.

Outras coisas imbecis que pessoas hipersensíveis podem ter e eu tenho:

- hipersensibilidade à cafeína. Sério, cê nem quer saber o que isso significa de forma prática - sendo que no meu caso, ela NÃO tira o sono. Inclusive muito pelo contrário. De falar 8 vezes mais rápido a precisar ir 50 vezes ao banheiro em 20 minutos, coisas estranhas acontecem quando eu tomo café. Quando pior a qualidade do café, piores os efeitos.

- enlouquecimento causado por barulhos altos e repetitivos. Tem gente que nem escuta alarmes disparados. Minha vida fica pausada até o barulho parar. PAUSADA. Meu cérebro entra em tela azul e não tem control alt del que resolva enquanto o barulho não parar. A única coisa que eu visualizo é um porrete na minha mão e a sirene sendo atacada ferozmente até calar a boca pra sempre. Meu sonho é estudar engenharias específicas para criar um alarme que CONSUMA a bateria do carro ou da casa em questã de minutos. Se deu 5 minutos e cê não foi ver a razão de seu carro ou casa estarem berrando, não vai ser deixando essa bosta disparada por 14 horas que vai fazer diferença. Também não vai espantar os meliantes nem resolver coisa nenhuma. Por alarmes que calem a boca bem rapidinho ou derretam o objeto em que estão contidos. Lá em casa, por exemplo, a sirene é silenciosa e os ~malandro~ nem vão saber que a cavalaria está chegando. HEH. Ó QUE MODERNO QUE NÓIS É. Ó QUE BONS VIZINHO. Mas pode ser até música: se algum versinho ou acorde se repete demais, cê vai me ouvir gritando É TELETUBBIES ESSA BOSTA? OS FÃ NÃO SABE LIDAR COM MAIS INFORMAÇÃO? Bem equilibrada mesmo.

- muita gente falando comigo ao mesmo tempo quase sempre tem um grito como resposta. Não é nem por mal, é reflexo. E eu sei que eu faço um gesto com as mãos e uma coisa com os olhos, que é tipo CÊIS TÃO ME DEIXANDO TONTA, favor sincronizar.

- EU NÃO VEJO FILME DE TERROR, EU NÃO VEJO FILME QUE PESSOAS ARRANQUEM PARTES DE SI MESMAS, CRIMES VIOLENTOS, SAI DAQUI COM ESSAS BOSTA, VAI VER LONGE DE MIM.

- não lido bem com crítica. Não posso fazer nada, se vira pra falar de um jeito que pareça bom ou aceita. É super bom esse traço na vida acadêmica, porque eu penso em me rasgar com uma certa frequência, mas seria muito incrível um atestado médico dizendo que as pessoas têm que me dizer onde eu errei COM EDUCAÇÃO, de preferência por escrito. E que minha aparência não é de suas contas etc, não estou num concurso de miss, FICA A LEMBRANÇA. 

Daí tipo, eu sou surda, né? Meus celulares antes do aifone todos tinham que ter acessibilidade ~visual~, ousseje, não apenas acender quando tocava, mas ter um sinal também luminoso pra quando eu perdesse ligação e mensagens. Quando eu comprei o aifone, eu adquiri também aquele tique nervoso de acender a tela em intervalos regulares de tempo, pra ver as notificações. Acho isso um pesadelo, até mesmo porque eu esqueço. Hihihi. Mas sabendo que rola altas acessibilidade, um  dia eu descobri que dá sim pro iphone piscar inteiro quando alguém liga. GEeeeeeeeeEEEeente do céu. Durou umas duas horas. Porque assim, nos bons tempos do nokia, 3 pessoas te ligavam durante a semana e cê recebia uns 50 sms, se fosse muito sociável, né? HOJE, você recebe uma base de 400 mensagens no whatsapp numa tarde e o troço fica parecendo uma discoteca [/gíria idosa], é insuportável. Eu nem consegui reparar se ele mantém o sinal enquanto você não nota que alguém falou com você, porque não sei se É POSSÍVEL não notar que alguém falou com você. Esses dias incrusível eu tava do lado de uma pessoa com um celular assim e deu pra ver o susto que todo mundo tomou quando a desgraça desatou a """tocar""". É violento, sabe? Já não basta a pessoa estar te enchendo o saco, o celular fatia sua retina. Não deu.

Das pessoas que a gente gosta, o FEELING avisa que tem notificação, eu sei pelo cheiro do celular quando c e r t o s b o y m a g y a fala comigo. É impressionante. HEH.

Todos os LEDs à minha volta vivem escondidos (rainha da fita isolante). O monitor do meu computador tem uma configuração de iluminação que leva em conta duas coisas: a luz atrapalhando meu olho AND o som da frequência que aquele tanto de luz faz. SIM, É REAL.

Eu não deixo relógios de pulso no meu quarto, eu seguro a mão de gente que fica batendo ritmadamente nas coisas, tipo talheres e potes da cozinha, eu sempre grito que todo mundo tem que ter seus próprios fones de ouvido pra não infernizar o amiguinho, eu me desestabilizo mesmo com sons que não escolhi escutar.

Eu sei quando o ar tá seco, eu praticamente consigo dizer com exatidão a porcentagem de umidade relativa. Costumo acertar quando um tecido é sintético, sempre compro sapato maior do que meu pé pra nada ficar encostando, sou a louca da loja de roupas ~íntimas~, porque ninguém compreende quando eu pego numa meia e sei que ela tem menos de 85% de algodão mesmo que a vendedora tente me enganar. 

Sabe?

É como se rolasse todo um sentido aranha pra coisas absolutamente inúteis.

Porque também funciona pra coisas relevantes, tipo: decorar o guarda-roupa inteiro das pessoas. Das que trabalham comigo, especialmente. Se elas repetem roupa, se elas compram roupa nova, se elas deixam de usar alguma coisa. Veja bem: tenho zero interesse nessas pessoas, eu não estou reparando porque eu quero. É só uma coisa que meu cérebro faz. Minha mãe é professora e eu tento organizar o guarda-roupa dela, porque eu falo "se você tiver um aluno como eu, ele não vai prestar atenção na aula, fazendo cálculos de quantas vezes você já usou isso aí". Até sequência de barbeamento das pessoas eu sei. Queria saber? NÃO.

Padrões que ninguém mais percebe, eu percebo todos. Eu sei que horas meus vizinhos tomam banho, cara. Sabe? É um desperdício de informação no cérebro. Tem dias que eu me dou conta que sei a disposição de carros no estacionamento do trabalho e eu NEM CONHEÇO SEUS DONOS.

O bom é que, ao reconhecer a hipersensibilidade, a gente pode criar técnicas de abafamento mental pra coisas inúteis. E é nisso que eu estou trabalhando comigo mesma, em me tornar uma pessoa que presta menos atenção. 

Até porque é IMPOSSÍVEL conversar com as pessoas. Elas vão me contar as coisas e eu quase sempre já notei, então rola todo um teatro pra fazer "ah é, e como é isso?" e ficar escutando a pessoa me contar o que eu já percebi sozinha, porque eu pareço BIRUTA se falar "ahhh, eu vi você fazendo a coisa x outro dia e concluí que era isso e dei uma olhadinha no seu facebook e já tô bem inteirada de tudo". Tipo hoje que me convidaram pra uma festa que eu já tava pensando se ia ou não há dias. Aí pensei: verdade, eu teoricamente nem deveria saber da existência disso aí, mas vi quando tava procurando um nome pra colocar numa lista e já internalizei a informação.

Sério, eu preciso desse espacinho extra na minha mente.


*****

Eu tava dando uma olhadinha nas novis no que diz respeito a HSP e vi que a autora do estudo está fazendo um crowdfunding pra estudar e escrever um livro sobre "pessoas hipersensíveis e o amor".

Sendo bem honesta, tivesse eu lido isso até uns meses atrás, me perguntaria se uma pessoa hipersensível tem CONDIÇÃO de amar. Agora, enquanto pessoa apaixonadinha, eu quero doar o valor total do livro. QUIDIS GRAÇA que é se relacionar amorosamente com essa condição (+ ansiedade + introversão).

Porque você analisa até a respiração da outra pessoa. Outro dia o infelizo falou uma frase no whatsapp por escrito. Ousseje, não tinha entonação, não tinha nada. Não tinha emoji também. Era só um "vejo depois, agora não posso". Mas meu dels do céu, fiquei CINCO DIAS sem falar com ele de novo. Ele provavelmente nem notou, porque apareceu na minha frente lindo e sorridente cinco dias depois, o que me fez compreender que nada tinha acontecido, além de dentro da minha cabeça, mais conhecido como NO MUNDO REAL. E eu vou aprendendo com ele (e ele nem sabe, né, ryzoz) que as coisas não funcionam como eu achava que funcionavam, as pessoas não seguem meu script e eu tenho que ir me adaptando com o que eu tenho disponível. Estou tendo que aprender a me expressar, porque é vários "não entendir" por dia, quando eu achava que meu raciocínio estava claríssimo. Mas o emocionante mesmo é passar 23 horas analisando um emoji ou um olhar e depois numa conversa aleatória me dar conta que nem tinha necessidade de gastar tanto tempo surtando em vez de VIVENDO.

Obviamente ainda estou engatinhando nesse quesito, mas, sei lá, se ninguém me mandou à merda ainda, é porque tá indo.

*****

A mensagem que eu queria passar pra vocês aqui é: escutem seus corazón, escutem o amiguinho. Muita gente nem sabe que é hipersensível. Muita gente sabe que não opera no mesmo sistema que a humanidade e fica se culpando, se achando errado, sofrendo por não pertencer. Eu já fui essa pessoa, sabe? E é muito sofrido. A gente já sofre demais porque sente tudo demais, vamo diminuir essa carga de sofrimento. 

E, o mais importante:

O mais provável é que você não seja hipersensível, então que tal empatia? Vamos evitar apelidinhos pra pessoas que choram, sentem dor e desconforto? Vamos evitar julgar o amiguinho que tá sempre com uma dor, um incômodo? Vamos parar de perguntar "melhorou?" "hoje você tá bem?", porque não melhora, não tá TUDO bem nunca, a gente geralmente guarda pra gente pra poder viver e se divertir e não encher o saco, então se organizar direitinho, todo mundo aproveita a vida.